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ARTIGO | Falta de água em Porto Alegre

Adinaldo Soares de Fraga- Engenheiro – Especialista em Saneamento e Meio Ambiente – aposentado do DMAE e membro do Conselho Deliberativo do DMAE e da Astec – Associado da Astec

Lembro que, em agosto do ano de 2017, escrevi um artigo no Jornal do Comércio, alertando a população de nossa capital que haveria falta de água em alguns bairros de nossa cidade. Naquela oportunidade, eu enfatizava a todos que a deficiência no abastecimento tinha como causa a falta de investimentos necessários para fazer frente às demandas de abastecimento, além de chamar a atenção para existência de uma clara e manifesta intervenção do Executivo municipal, na autonomia administrativa do Departamento Municipal e Água e Esgotos (DMAE). Alertei. também, que a falta de água que ocorreria, não seria por culpa dos servidores municipais daquela autarquia. Posteriormente, em inspeção especial do Tribunal de Contas do Estado (TCE), os auditores comprovaram que, de fato, havia uma intervenção do prefeito, cujo objetivo era o de precarizar os serviços prestados pelo Departamento, pavimentando um caminho para sua condução à concessão dos serviços de saneamento de Porto Alegre. Recentemente, houve condenação por parte do TCE ao prefeito da época, por essas ações intervencionistas que impactaram o desempenho do DMAE no atendimento às demandas operacionais de nossa cidade. De lá para cá, com assunção de uma nova administração, nada mudou a ponto de modificar esse quadro. Sete anos se passaram, os poucos investimentos realizados não afastaram o fantasma do desabastecimento nos mesmos bairros, mas a ideia de concessão dos serviços ainda persiste. O prefeito Melo, quando em campanha, disse que não privatizaria o DMAE, porém ao assumir, deu prosseguimento a ideia de concessão dos serviços, gestada na gestão Marchezan – porém, com uma palavra mais agradável: “parceirização”. Enquanto isso, parte da população de nossa cidade persiste em sua saga de sofrimento pela falta de água, nos períodos de altas temperaturas.

O prefeito Melo mantém a postura do governo anterior, intervindo claramente na administração do DMAE, contingenciando a realização de concursos públicos para suprir as vagas deixadas por aposentadorias. O provimento das vagas em aberto através de concursos, quando o faz, o número de servidores chamados é insuficiente para cobrir a demanda. Para piorar a imagem do DMAE perante a população porto-alegrense, os serviços de leitura terceirizados vêm apresentando problemas com a empresa contratada, pois esses serviços não estão sendo corretamente realizados, gerando descontentamento dos usuários, os quais tiveram suas contas de água apropriadas com cifras acima dos valores normalmente praticados. Paralelo a isso, segundo relatório de gestão, o DMAE apresentou, em 2022, um superávit financeiro de R$ 330 milhões, chegando hoje, em dezembro de 2023, a um valor superior a R$ 400 milhões.

Analisando apenas sob a ótica financeira, poderíamos achar ótimo esse superávit, mas com um olhar mais acurado, diríamos que um órgão público como o DMAE foi relapso nos investimentos, gerando reclamações de falta de água em várias regiões da cidade, principalmente nas regiões sul e leste (bairro Belém Novo, Restinga, Lomba do Pinheiro, Morro da Cruz). Como justificar a uma população sofrida com a falta de abastecimento que investimentos deixaram de ser realizados não por falta de recursos financeiros, mas por falta de ações necessárias para suprir sua demanda? Isso significa que o DMAE priorizou fazer fluxo de caixa em vez de investir na melhoria do sistema de abastecimento. Sabidamente, um órgão saudável não deve gerar prejuízos, mas partindo-se de uma premissa básica de que, se houve sobra em caixa de valores nesta ordem, significa que investimentos deixaram de ser realizados para a melhoria do abastecimento de nossa cidade.

Para os próximos dois anos, estão previstos investimentos na ordem de R$ 350 milhões. Desses, R$ 166 milhões serão para melhorias e ampliação do abastecimento de água da capital, conforme apresentação ao Conselho Deliberativo do plano de investimento para o próximo biênio. Por que somente agora, depois de sete anos, haverá investimentos vultosos no saneamento em Porto Alegre? Será porque estamos às portas de um ano eleitoral, onde teremos novas promessas de campanha? Enquanto isso a população sofre com a falta de água e o DMAE com R$ 400 milhões aplicados no sistema financeiro. Seria a especulação financeira a atividade fim do DMAE? A quem interessa manter esses recursos em caixa? São perguntas que carecem de uma resposta pela Administração Municipal.

Referência

MILMAN, Guilherme. Moradores de Porto Alegre enfrentam falta de água. Zero Hora: Porto Alegre, p. 24, 16 e 17 dez. 2023.

 

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